Fonte de sabedoria

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Miriam Gimenes

Pesquisa ‘Retratos da Leitura no Brasil’ mostra que, na contramão do que vem acontecendo com os adultos, as crianças têm lido mais nos últimos anos
 
Sarah Ferreira de Souza, 10 anos, de Santo André, é uma leitora voraz. Sua paixão pelos livros nasceu pelo incentivo da escola, onde hoje cursa o 5º ano do ensino fundamental e participa, inclusive, do clube de leitura. O que não diminui, no entanto, a importância do estímulo que também tem casa. Todo ano, no Natal, ela e o irmão ganham uma cota para gastar na livraria. É a redenção para a pequena. “Gosto muito de livros que falam sobre o que está acontecendo no mundo, sobre o racismo, e os que nos ensinam a lutar”, diz, com o livro  História de Ninar para Garotas Rebeldes em punho. A obra conta a história de 100 mulheres que fizeram diferença na história da humanidade.
 
 
Além de fonte de sabedoria, para Sarah, o livro funciona como um amigo. “Gosto muito de ler quando estou chateada. Me ajuda a esquecer meus problemas.” Para escolher os títulos, faz busca de resenhas na internet e sonha em, quem sabe um dia, fazer o seu próprio canal de indicações. 
A boa notícia é que Sarah não está sozinha em seu apreço pela literatura. Pesquisa recém-divulgada, Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro e Itaú Cultural e que está na 5ª edição, mostra que, na contramão do que aconteceu com os adultos nos últimos quatro anos – em que houve uma diminuição de cerca de 4,6 milhões de leitores no País (de 56% para 52%) –, as crianças entre 5 e 10 anos apresentaram acréscimo de 4 pontos percentuais na proporção de leitores. “Apesar de o professor ter sido o mais citado como influenciador da leitura, se você somar o índice de pai e mãe, a família é mais citada. Na faixa dos 5 a 10 anos, em especial, a mãe é quem mais influencia os filhos a ler”, detalha a coordenadora da pesquisa, Zoara Failla. 
 
Essa realidade é forte, acrescenta, em famílias que têm ensino superior, que costumam ler para seus filhos e presentear com livros. “O que, infelizmente, não é o perfil de grande parte da família brasileira. Mas estamos verificando também que quem não tem (influência em casa), que vem de família mais vulnerável e está em escola pública, os professores também estão cumprindo esse papel, de influenciar. Esse é um dos resultados mais positivos da pesquisa”, pontua.
 
Observou-se, na coleta de dados, que o professor é o maior responsável por incentivar o interesse dos alunos (52%), porém os filmes baseados em livros também foram um fator de interesse (48%), assim como a indicação de amigos (41%) e a identificação com o autor (35%). Números que incluem adolescentes e adultos, duas faixas preocupantes do levantamento. 
 
Zoara diz que, nos leitores adultos, a queda significativa foi nas classes A e B. “E quando a gente verifica o que estão fazendo no tempo livre, são citadas internet, redes sociais. É possível que haja a substituição da leitura pelo uso das redes sociais”, analisa. Embora a tecnologia tenha ganhado espaço,  o livro físico, no entanto, está na preferência de 67% dos leitores em relação ao e-book. Vale lembrar que é considerado leitor todo aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos um livro nos três meses anteriores à entrevista e não leitor quem declarou não ter lido qualquer livro nesse período, ainda que tenha lido nos 12 meses anteriores à entrevista. 
 
 
FOMENTAR A LEITURA
 
E como melhorar os números desta pesquisa? “É responsabilidade de toda sociedade: dos pais, do professor, da escola, da biblioteca, das mídias. De todos nós. A gente sabe que algumas famílias têm essa compreensão. A internet, as redes sociais, podem ser trabalhadas, até como uma ferramenta de acesso ao livro, compartilhamento de leituras realizadas. É um novo fenômeno que precisa ser melhor trabalhado”, ressalta a pesquisadora. 
O que não substitui, no entanto, a mediação de leitura por um adulto. “Hoje você tem vários estudos mostrando a dificuldade que as crianças têm de concentração, são hiperativas e a leitura possibilita até você desenvolver essas habilidades, além de análise da narrativa e competências fundamentais para estudos mais complexos. Também ajuda na capacidade de investigação, crítica, instiga a ir atrás da verdade, de conseguir ter esse discernimento. Com tudo isso você vai desenvolvendo o gosto pela leitura.” Os pais viram, portanto, curadores dos filhos. “E isso deixa de acontecer depois dos 11 anos. Quando as crianças são pequenas os pais se preocupam em comprar o livro infantil, lê com o filho na cama. Quando chega na pré-adolescência. pode até presentear com livros, mas já não tem mais essa mediação. Isso, de alguma forma, a pesquisa nos diz, de como é importante você manter essa mediação”, alerta Zoara. 
É nas crianças, portanto, que tem de ser cultivada a semente da busca incessante de informação. “Por isso a importância de ter, até nas creches, espaços onde as crianças possam ter contato com múltiplas linguagens, leitura, ilustração, arte. Tudo isso desperta os encantamentos e amplia o repertório dessa criança.” Uma vez encantadas na infância, quando estiverem no ensino fundamental e médio já estarão picadas pelo bichinho da leitura.  E esta é a melhor vacina para remediar um mundo cheio de desinformação.
 
“Minha paixão pela leitura começou com minha mãe lendo para mim, quando eu era menor. A minha escola também incentiva muito, então 
fui cada vez gostando mais.  Um dos livros que mais me encantaram foi o que conta a história da Malala. (A Menina que Queria ir para Escola) É importante sempre incentivar a leitura. Por isso penso, quando crescer, em trabalhar em biblioteca ou com ilustração.”
Helena Assencio Galdi, 12, de Santo André
 



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