Camila foi um chamado

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Miriam Gimenes

Carolina Dieckmann, com quase três décadas de carreira, teve certeza de que queria ser atriz em ‘Laços de Família’, novela no ar em ‘Vale a Pena Ver de Novo’

Protagonista de uma das cenas mais emblemáticas da história da teledramaturgia brasileira, a atriz Carolina Dieckmann, 42 anos, está com quase três décadas de carreira. A jovem, que estreou na TV na série Sex Appel, em 1993, sete anos depois, em Laços de Família, folhetim de Manoel Carlos – no ar no Vale a Pena Ver de Novo, na Globo –,  ainda tinha dúvida se queria seguir a carreira de atriz. “A Camila foi um presente. No momento eu estava com esta questão (carreira) e chega um personagem escrito para mim, lindo, rico desse jeito, foi um chamado. Entendi muita coisa da profissão a partir dela.” 

A cena descrita no início do texto, retransmitida recentemente, é a que a personagem, após descobrir que estava com leucemia, raspou o cabelo em razão dos efeitos da quimioterapia. Tudo ao som de Love By Grace, de Lara Fabian. E, ainda que tenha passado 21 anos da gravação, a atriz confessa que se emocionou ao rever. “Chorei porque estava entregue ao personagem.” 

E não só ela foi tocada novamente. A emissora bateu recorde de audiência na transmissão, em meados de fevereiro. Foram 25,7 pontos de média e picos de 29 – nos dias de apresentação normal este número chega a 17. Cada ponto equivale a 76.577 lares. “Novela a gente nunca sabe quando vai fazer sucesso. Se isso fosse uma fórmula seria mais fácil. Só que essa novela, como as outras do Manoel Carlos,  fez muito sucesso porque fala dessa coisa da família. Mesmo passando à tarde é um assunto que quem é filho se identifica, quem é pai se identifica, quem é avô se identifica”, analisa. Carol, que atualmente mora nos Estados Unidos, confessa que é bom rever a história, principalmente por ter sido gravada há 20 anos. “Eu já não tenho tantas coisas frescas na memória, então, quanto mais distante eu estiver do tempo, acho que mais esqueço e acho melhor ainda de rever. Consigo me emocionar sem identificar o que  fiz para as pessoas se emocionarem. Consigo ser mais expectadora do trabalho e fica mais gostoso de ver.”

O fato é que a personagem, além de tocar o público, ajudou de forma considerável na campanha de doação de medula à época em que foi apresentada. Em 2001 foram registradas pelo Ministério da Saúde 23 mil doações de medula óssea, um recorde no momento. Por essa e outras razões, a personagem guarda um pedaço grande do coração da atriz. “Realmente a Camila aconteceu em um momento da minha vida muito especial. Era um momento de decisão, de eu acabar de ter sido mãe (Davi, fruto de seu casamento com o ator Marcos Frota, de quem se separou em 2003), estar com os sentimentos muito aflorados, teve uma carga emocional muito especial.”

Só que no início da novela a empatia com a personagem não foi tão grande. Para quem não assistiu, Camila se apaixonou pelo namorado da mãe, Helena (Vera Fischer), o ator estreante Reynaldo Gianecchini, que fazia Edu. “Na época da novela não tinha internet, mas tinha uma (hashtag) euodeiocamila, que não era essa força toda de hoje, mas era muito forte, assustador, replicado por milhões de pessoas. Depois surgiu o amocamila, quando ela fica doente. Foi a primeira novela que eu vi a força da internet começando a aparecer. E eu adoro tudo (sobre internet), quando as pessoas falam, os memes, realmente essa conversa entre a internet e a televisão é muito rica, muito gostosa de acompanhar, acho muito legal tudo que sai sobre.”

Hoje mãe de um jovem de 22 anos e também do adolescente José, 14 anos, fruto de seu casamento com o produtor de TV Tiago Worcman, ela vê os mesmos conflitos que tinha na época da gravação da novela reproduzirem. “É um momento em que você começa a se entender como adulto, pensar o que quer fazer da sua vida, qual profissão, se quer casar, quer esperar, todas essas questões humanas. Muda a paisagem,  mas estas questões não vão mudar nunca. E sempre um crescimento, amadurecimento do ser humano em relação ao outro, ao mundo. Vejo Davi fazendo a faculdade dele, preocupado como vai trabalhar, eu estava muito assim nesta época, com a idade dele”, lembra. E ela está lá para apoiá-los, sempre, e seguir as necessidades da família. 

Tanto que não titubeou ao mudar-se para os Estados Unidos quando o marido recebeu uma proposta de trabalho. “Jamais escolheria (sair do Brasil), porque realmente sou muito identificada com meu País, meu trabalho foi construído em cima de uma emoção muito brasileira, a coisa da novela, que é o que eu tenho vontade de fazer. A novela chega a lugares que nenhuma outra arte chega, tem essa possibilidade.”

Mas foi por causa dessa mudança que ela percebeu ter também outras aptidões. Começou a desenhar, por exemplo. Tornou-se ilustradora e tem até estampas em roupas de praia. “Comecei a pintar tem uns seis anos, um pouco antes de vir para cá. Quando cheguei aqui, o tempo que ficava aqui era muito para mim. Os meninos na escola o dia inteiro, o Tiago trabalhando e eu fiz curso de inglês, pintura, anatomia humana e tive muito tempo para pintar, para começar a realmente ter um espaço para fazer isso. Foi muito lindo também, porque foi um processo muito íntimo. Seria muito dificil eu ter esse processo se estivesse no meio de uma novela. A minha vida no Brasil sempre foi muito corrida, trabalhando muito”, lembra. E, durante a pandemia, usou também e sua arte para ajudar os outros. Confeccionou e desenhou em máscaras distribuídas para família, amigos e em instituições de caridade. Sentiu-se feliz em poder ajudar de alguma forma.

“Passei três ou quatro meses fazendo máscaras, pintando e pensando naquilo ter uma mensagem, chegar na pessoa com carinho, energia. Foi um momento muito bonito, que nunca vou esquecer, de realmente todo dia acordar e fazer alguma coisa para o outro. Por mais que tenha começado para mim depois aquilo teve um sentido muito lindo.”

Carolina, que atuou também em diversos outros papéis – Tropicaliente, Malhação, Mulheres Apaixonadas, Da Cor do Pecado, Senhora do Destino, Cobras & Lagartos, Passione, Fina Estampa, Salve Jorge, Joia Rara, A Regra do Jogo, O Sétimo Guardião, entre outros – não tem nenhuma novela nos planos. Apenas quer voltar a apresentar o seu show Karolque, projeto musical interrompido por causa da pandemia.. E qual é seu sonho? “Meu maior sonho é ter saúde. Ter alegria, minha família saudável, feliz, unida. Não tenho um sonho com cara de sonho, o meu tem cara de realidade, essas coisas que já vivo. Sou muito feliz e sonho em continuar assim, com minha família comigo.” Os laços de família, para ela, são indissolúveis.

 



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